Os policiais militares hoje são escravos do tempo moderno. A afirmação é do deputado estadual Soldado Prisco (PSC), para quem, mesmo com um “regulamento arcaico e ultrapassado”, a maior conquista da categoria é o respeito que a corporação tem hoje. “Graças a Deus, há discussão em Brasília pra que se unifique e se desmilitarize as polícias”, afirma. Com formação militar, Prisco se diz vítima de perseguição política e assegura: “sou calmo e tranquilo, apesar de não parecer”. Confira nesta entrevista, também transmitida pela TV Alba (canal aberto 12.2 e 16 na Net).
O senhor começou sua história política defendendo os direitos dos policiais militares na greve de 2001 e, a partir daí, coleciona polêmicas por conta de uma postura aguerrida, às vezes de confronto até. Quem é o deputado Soldado Prisco?
Sou uma pessoa serva de Deus, batizada e consagrada na fé há 21 anos. Mantenho uma coerência ideológica. As pessoas, às vezes, entendem o que é ser radical sem conhecer exatamente o que falam. Ser radical é manter sua coerência. Não mudo minha forma de ser. A pessoa que entra na política é um servidor da população, dos seus projetos, do que a categoria espera. Eu sou essa pessoa. Sou calmo, tranquilo, extremamente pacífico, apesar de não parecer. E gosto do diálogo, o instrumento mais fantástico da democracia.
O senhor já foi denunciado por crimes políticos e formação de quadrilha, preso por liderar greve da Polícia Militar e precisou responder ao Ministério Público da Bahia por utilizar familiares, inclusive crianças, como escudo humano, quando a Assembleia Legislativa foi ocupada por militares grevistas. Ou seja, o senhor se diz calmo, mas também gosta de uma briga?
Sou extremamente calmo e tranquilo. Essas denúncias feitas no passado, todas morreram judicialmente, eram infundadas. Infelizmente, na democracia existem pessoas que utilizam instrumentos estatais pra combater aquilo que no diálogo não querem avançar. Até quando se faz uma greve, se arromba uma porta, você quer dialogar. A greve é o último instrumento do trabalhador. Inclusive, tenho orgulho de ter sido preso por greve de polícia. As lutas foram necessárias. Todas as figuras que fizeram denúncias [contra mim] estão aí enquadradas na Operação Faroeste. E eu as denunciei lá atrás, provando que a guerra contra mim era muito mais política. A guerra tem que ser na democracia.
Mas greve de militares não é ilegal, deputado?
Pode até ser ilegal, mas não imoral. Imoral é a sociedade estar sofrendo. A nossa greve nunca foi corporativista. A gente pensa na sociedade. A nossa luta sempre foi pra buscar o melhor pra população. Se aquele que faz a ponta não estiver estimulado, não tiver condições, a sociedade é a primeira a sofrer. E nós sempre lutamos contra isso.
Mas sendo ilegal, como justificar uma greve de militares?
O que justifica é o governo não sentar pra dialogar e impor um regulamento arcaico e ultrapassado. Muita coisa que era ilegal no passado hoje é legal. Graças a Deus, ainda há discussão em Brasília pra que se unifique e se desmilitarize as polícias. É um sonho nosso ver o policial militar passar a ser gente. A Constituição ainda não nos vê assim. Os policiais militares hoje são escravos do tempo moderno. Não temos direito a quase nada. Na democracia todo mundo tem direito à liberdade de expressão. Mas pra gente poder falar, tem que pedir autorização ao superior hierárquico. A população tem que conhecer o que está dentro dos quarteis.
Quais as principais conquistas dos policiais militares durante a sua atuação parlamentar?
Nada foi dado pelo Estado, tudo foi conquistado. A nossa conquista maior é o respeito que a corporação tem hoje, os ganhos na base da luta. Por exemplo, a GAP [Gratificação por Atividade Policial] 4 e 5 a que a gente tinha direito. O policial militar não podia casar, tinha que pedir permissão ao superior hierárquico. Também não tinha auxílio transporte, auxílio alimentação. O policial militar não podia exercer o duplo vínculo na área da educação e saúde. Ele tinha formação acadêmica mas não podia exercer. A lei proibia. Eram amarras que a gente tinha no passado. Hoje são conquistas históricas.
O senhor é autor de projeto de lei que propõe isenção de pedágio nas rodovias estaduais para policiais federais, militares, civis e até agentes penitenciários e guardas municipais. Por que apresentou esse projeto e quais as chances de ser aprovado?
Se o governo quisesse dialogar, as chances seriam enormes. E se fosse um pouco sensato, ia entender o porquê. De uns três anos pra cá, três policiais foram assassinados nos pedágios. Somos uma categoria diferente. Só por ser identificado como policial militar, sua pena de morte está ali sacramentada. O acesso livre no pedágio é importante por isso. E também pelo custo de vida. O combustível hoje está alto e os policiais militares têm que se deslocar muito num estado grande como a Bahia. Seria uma concessão, não um privilégio. E uma vantagem não só para o policial, mas para toda a sociedade e o próprio governo.
Outro projeto seu defende acesso livre aos profissionais de segurança em cinemas, teatros, casas culturais em geral. Em que pé está a tramitação?
Ainda não caminhou na Casa. É outro entendimento que o governo também não quer ajudar. Eu acho que é uma forma de colocar cada vez mais o policial inserido na sociedade, de fornecer pra ele um lazer, porque o sistema que os policiais tratam no dia a dia é muito opressor, com muita violência. É uma forma de inserir os policiais no meio cultural, garantir esse benefício. Infelizmente, o projeto está tramitando na Casa mas não tem avançado.
O senhor também propõe a obrigatoriedade de instalação de câmeras de segurança em estacionamentos no âmbito do estado da Bahia. É mais um projeto que está emperrado?
Está emperrado. E um projeto de iniciativa excelente, até para o próprio governo, porque as violências acontecem, nós vemos. O projeto nasceu após uma médica e sua filha, num grande estacionamento de Salvador, terem sido sequestradas e a mãe estuprada e morta. Isso acontece com certa frequência nos grandes estacionamentos e você não tem a mínima segurança. [O projeto] tira até o peso do próprio Estado, porque é obrigação do Estado fazer a segurança, mas a iniciativa privada também pode participar nesse sentido.
O senhor é titular da Comissão de Direitos Humanos e Segurança Pública da Assembleia Legislativa. Como tem sido sua atuação no colegiado?
De fiscalização, porque é o nosso papel. Um papel de fiscalização, de visita aos quarteis, às unidades, cobrando melhorias. Nós temos unidades da Polícia Militar que não têm banheiro feminino. E a comissão já foi lá, já verificou e, até agora, não teve a mudança. Meu papel na comissão tem sido mais nesse sentido, de fiscalizar e cobrar.
O senhor já passou por partidos como PTC, PSDB, PPS e, desde 2018, está no Partido Social Cristão. Por que tanta mudança e o que o motiva a permanecer no PSC?
O PSC nos deu aquilo que a gente sempre buscava, que é a democracia, o diálogo, o respeito, coisas que nos outros partidos, infelizmente, não tinham. Havia muita imposição. No PSC há conversa. É um partido também que me dá garantia e tranquilidade por ser cristão. Se Deus permitir, quero continuar nele pra sempre.
O senhor hoje é um oposicionista do governo, mas já fez parte da militância de partidos de esquerda como PT, PCdoB e PSOL. Como foi essa experiência?
Foi um aprendizado muito grande, quando esses partidos não estavam no poder. Após chegarem ao poder, demonstraram sua verdadeira face, não em prol da população e do social, mas em prol do poder. E estão até hoje assim. Me afastei. É a coerência ideológica que eu falei no início. Todo aquele discurso que eles faziam no passado, hoje fazem totalmente ao contrário. Ao nosso modo de ver, é uma hipocrisia e uma demagogia muito grande.
Que tipo de discurso, por exemplo?
O discurso contra o racismo. Eles usam essa plataforma. Quando o policial negro morre assassinado ou quando a pessoa pobre morre pelo tráfico, você não vê esse combate. Também a perseguição política. O governo, no passado, criticava tanto isso e hoje persegue seus adversários políticos. A partir do momento em que não paga emenda impositiva, ele não está prejudicando só o deputado Soldado Prisco, mas toda a Bahia. Emenda impositiva é ambulância, trator, equipamentos médicos. Isso que eles criticavam no passado, que na Bahia tinha coronelismo, hoje é muito pior. A perseguição é muito maior.
O senhor é um oposicionista incondicional ou tem espaço também para votar com o governo?
Já votei a favor do governo. Não faço oposição por ser oposição. Acho isso uma hipocrisia, uma demagogia. E o governo sabe disso. A nossa posição é uma oposição coerente. As nossas críticas são pontuais e verdadeiras. O governo deveria debater mais, abrir mais espaço, coisa que não faz. Como nessa questão das emendas impositivas. Não só pra mim, mas pra toda a Casa. Uma dificuldade enorme, fica parecendo barganha política. Comigo não tem barganha. É lei. Não estou pedindo nada ao governador. Ele tem que cumprir o que está escrito na lei.
Qual será sua participação e a do PSC na corrida ao governo do estado em 2022?
O partido está caminhando com o ex-prefeito de Salvador ACM Neto. Sou da base do ex-prefeito, vamos caminhar com ele na oposição pra gente mudar a realidade da Bahia. É a posição do partido e a minha posição.
ACM Neto está prestes ter formalizada a fusão do DEM com o PSL para gerar o União Brasil, novo partido que poderá até lançar candidato próprio à presidência. Como o senhor avalia essa fusão?
Muito boa essa fusão de dois grandes partidos, se o pensamento for como está sendo, em prol do Brasil. Vou caminhar com o presidente Jair Messias Bolsonaro, é uma posição minha. O [pré-]candidato ACM Neto sabe. Mesmo que o [pré-]candidato ao governo que estou apoiando na Bahia apoie outro candidato, vamos caminhar com a coerência que a gente sempre teve de apoiar o atual presidente para a eleição presidencial. Eu não vejo hoje espaço, a menos de dez meses para a eleição, para uma terceira via. Vai ser muito difícil trabalhar em tão pouco tempo num país continental como o Brasil. Mas vamos aguardar pra ver qual será o cenário.
O senhor vai tentar a reeleição em 2022?
Vou pra reeleição a deputado estadual na Bahia. Com a graça e a glória do nosso senhor Jesus Cristo, a gente vai sair vitorioso pra continuar trabalhando em prol do povo da Bahia e, quem sabe, ser situação, finalmente. Ser oposição com esse governo aí é uma luta muito grande.